quarta-feira, 9 de abril de 2008

QUADRO DE PROFESSORES-VISITANTES DO SEMINÁRIO TEOLÓGICO DO SUL - S.T.S.

Reverendo Ismael Arcas
Pastor da Primeira Igreja Presbiteriana Independente de São José dos Campos (SP). Ismael Arcas no mes de maio estará dando aula no SEMINÁRIO TEOLÓGICO DO SUL.
A matéria na qual irá dar para os alunos é Cristologia. Sua apóstila-livro já esta pronta e será entregue para os alunos na sala de aula do S.T.S.

Seminários e Faculdades Teológicas que Ismael Arcas já lecionou como professor e diretor.

INSTITUIÇÕES TEOLÓGICAS
Instituto e Seminário Teológico José Manoel da Conceição - Presbiteriano
Instituto e Seminário Bíblico João Calvino - Presbiteriano
Faculdade de Teologia Batista. -
ATVIDADES DOCENTES
Diretor do Instituto e Seminário Bíblico – Beira – Mar - Florianópolis SC
Diretor do Instituto Bíblico Beréia – Joinville – SC
Diretor do Centro de Educação Teológica - Assis –SP

Professor nas seguintes Instituições

INSTITUTO E SEMINÁRIO BÍBLICO BEIRA-MAR
- Teologia Sistemática
- Antropologia Bíblica
- História da Igreja

INSTITUTO BÍBLICO BERÉIA
- Teologia Sistemática
- Teologia Pastoral

CENTRO DE EDUCAÇÃO TEOLÓGICA DE ASSIS
- História da Igreja
- Teologia do N. Testamento

ESCOLA DE EDUCAÇÃO TEOLÓGICA DAS ASSEMBLÉIAS DE DEUS
EETAD
- Epístolas Paulinas -- Epístolas Gerais -- Missiologia
- Pentateuco- - Hermenêutica- Homilética
- Soteriologia - História da Igreja

SEMINÁRIO TEOLÓGICO CONGREGACIONAL
- Missiologia

FACULDADE DE TEOLOGIA BATISTA DE JUNDIAÍ
- Hermenêutica
- Teologia Pastoral

CENTRO DE INFORMAÇÃO DE TEOLOGIA LOGOS
- Teologia Sistemática

OPERAÇÃO MOBILIZAÇÃO BRASIL – OM-BRASIL
- História da Igreja

terça-feira, 1 de abril de 2008

A DOUTRINA REFORMADA DA AUTORIDADE SUPREMA DAS ESCRITURAS

A doutrina que me proponho a considerar neste artigo foi de fundamental importância na Reforma Protestante do Século XVI. Em contraposição, por um lado, à doutrina católica romana de uma tradição oral apostólica e, por outro lado, ao misticismo dos assim chamados entusiastas ou reformadores radicais, os Reformadores defenderam a doutrina da autoridade suprema das Escrituras. Essa foi, portanto, a resposta deles à autoridade da tradição eclesiástica e do misticismo pessoal.

A autoridade suprema das Escrituras também é uma doutrina puritano-presbiteriana. A ela os puritanos tiveram que apelar freqüentemente na luta que foram obrigados a travar contra as imposições litúrgicas da Igreja Anglicana.1 A Confissão de Fé de Westminster professa a referida doutrina em três parágrafos do seu primeiro capítulo. No quarto parágrafo, ela trata da origem ou fundamento da autoridade das Escrituras:


A autoridade da Escritura Sagrada, razão pela qual deve ser crida e obedecida, não depende do testemunho de qualquer homem ou igreja, mas depende somente de Deus (a mesma verdade) que é o seu Autor; tem, portanto, de ser recebida, porque é a Palavra de Deus.
O parágrafo quinto aborda a questão da certeza ou convicção pessoal da autoridade das Escrituras:


Pelo testemunho da Igreja podemos ser movidos e incitados a um alto e reverente apreço pela Escritura Sagrada; a suprema excelência do seu conteúdo, a eficácia da sua doutrina, a majestade do seu estilo, a harmonia de todas as suas partes, o escopo do seu todo (que é dar a Deus toda a glória), a plena revelação que faz do único meio de salvar-se o homem, as suas muitas outras excelências incomparáveis e completa perfeição são argumentos pelos quais abundantemente se evidencia ser ela a Palavra de Deus; contudo, a nossa plena persuasão e certeza da sua infalível verdade e divina autoridade provém da operação interna do Espírito Santo que, pela Palavra e com a Palavra, testifica em nossos corações.


O décimo e último parágrafo desse capítulo confere às Escrituras (a voz do Espírito Santo) a palavra final para toda e qualquer questão religiosa, reconhecendo-a como supremo tribunal de recursos em matéria de fé e prática:


O Juiz Supremo, pelo qual todas as controvérsias religiosas têm de ser determinadas, e por quem serão examinados todos os decretos de concílios, todas as opiniões dos antigos escritores, todas as doutrinas de homens e opiniões particulares; o Juiz Supremo, em cuja sentença nos devemos firmar, não pode ser outro senão o Espírito Santo falando na Escritura.


Em dias como os que estamos vivendo, em que cresce a impressão de que o evangelicalismo moderno (particularmente o brasileiro) manifesta profunda crise teológica, eclesiástica e litúrgica,2 convém considerar novamente essa importante doutrina reformado-puritana. Convém uma palavra de alerta contra antigas e novas tendências de usurpar ou limitar a autoridade da Palavra de Deus. Tal é o propósito deste artigo.


I. Definição
O que queriam dizer os Reformadores ao professarem a doutrina da autoridade das Escrituras? Que, por serem divinamente inspiradas, elas são verídicas em todas as suas afirmativas. Segundo esta doutrina, as Escrituras são a fonte infalível de informação que estabelece definitivamente qualquer assunto nelas tratado: a única regra infalível de fé e de prática, o supremo tribunal de recursos ao qual a Igreja pode apelar para a resolução de qualquer controvérsia religiosa.
Isto não significa que as Escrituras sejam o único instrumento de revelação divina.

Os atributos de Deus se revelam por meio da criação: a revelação natural (cf. Sl 19:1-4 e Rm 1:18-20). Uma versão da sua lei moral foi registrada em nosso coração: a consciência (cf. Rm 2:14-15), "uma espiã de Deus em nosso peito," "uma embaixadora de Deus em nossa alma," como os puritanos costumavam chamá-la.3 A própria pessoa de Deus, o ser de Deus, revela-se de modo especialíssimo no Verbo encarnado, a segunda pessoa da Trindade (cf. Jo 14.19; Cl 1.15 e 3.9).
Mas, visto que Cristo nos fala agora pelo seu Espírito por meio das Escrituras, e que as revelações da criação e da consciência não são nem perfeitas e nem suficientes por causa da queda, que corrompeu tanto uma como outra, a palavra final, suficiente e autoritativa de Deus para esta dispensação são as Escrituras Sagradas.


II. Base Bíblica
A base bíblica da doutrina reformada da autoridade suprema das Escrituras é tanto inferencial como direta.


A. Base Inferencial
É inferencial, porque decorre do ensino bíblico a respeito da inspiração divina das Escrituras. Visto que as Escrituras não são produto da mera inquirição espiritual dos seus autores (cf. 2 Pe 1.20), mas da ação sobrenatural do Espírito Santo (cf. 2 Tm 3.16 e 2 Pe 1.21), infere-se que são autoritativas. Na linguagem da Confissão de Fé, a autoridade das Escrituras procede da sua autoria divina: "porque é a Palavra de Deus."

Isto não significa que cada palavra foi ditada pelo Espírito Santo, de modo a anular a mente e a personalidade daqueles que a escreveram. Os autores bíblicos não escreveram mecanicamente. As Escrituras não foram psicografadas, ou melhor, "pneumografadas." Os diversos livros que compõem o cânon revelam claramente as características culturais, intelectuais, estilísticas e circunstanciais dos diversos autores. Paulo não escreve como João ou Pedro. Lucas fez uso de pesquisas para escrever o seu Evangelho e o livro de Atos.
Cada autor escreveu na sua própria língua: hebraico, aramaico e grego. Os autores bíblicos, embora secundários, não foram instrumentos passivos nas mãos de Deus. A superintendência do Espírito não eliminou de modo algum as suas características e peculiaridades individuais. Por outro lado, a agência humana também em nada prejudicou a revelação divina.
Seus autores humanos foram de tal modo dirigidos e supervisionados pelo Espírito Santo que tudo o que foi registrado por eles nas Escrituras constitui-se em revelação infalível, inerrante e autoritativa de Deus. Não somente as idéias gerais ou fatos revelados foram registrados, mas as próprias palavras empregadas foram escolhidas pelo Espírito Santo, pela livre instrumentalidade dos escritores.4 O fato é que, por procederem de Deus, as Escrituras reivindicam atributos divinos: são perfeitas, fiéis, retas, puras, duram para sempre, verdadeiras, justas (Sl 19.7-9) e santas (2 Tm 3.15).5


B. Base Direta

Mas a doutrina reformada da autoridade das Escrituras não se fundamenta apenas em inferências. Diversos textos bíblicos reivindicam autoridade suprema.
Os profetas do Antigo Testamento reivindicam falar palavras de Deus, introduzindo suas profecias com as assim chamadas fórmulas proféticas, dizendo: "assim diz o Senhor," "ouvi a palavra do Senhor," ou "palavra que veio da parte do Senhor."6 No Novo Testamento, vários textos do Antigo Testamento são citados, sendo atribuídos a Deus ou ao Espírito Santo. Por exemplo: "Assim diz o Espírito Santo..." (Hb 3:7ss).7

A autoridade apostólica também evidencia a autoridade suprema das Escrituras. O Apóstolo Paulo dava graças a Deus pelo fato de os tessalonicenses terem recebido as suas palavras "não como palavra de homens, e, sim, como em verdade é, a palavra de Deus, a qual, com efeito, está operando eficazmente em vós, os que credes" (1 Ts 2:13). Que autoridade teria Paulo para exortar aos gálatas no sentido de rejeitarem qualquer evangelho que fosse além do evangelho que ele lhes havia anunciado, ainda que viesse a ser pregado por anjos? Só há uma resposta razoável: ele sabia que o evangelho por ele anunciado não era segundo o homem; porque não o havia aprendido de homem algum, mas mediante revelação de Jesus Cristo (Gl 1:8-12).

Jesus também atesta a autoridade suprema das Escrituras: pelo modo como a usa, para estabelecer qualquer controvérsia: "está escrito"8 (exemplos: Mt 4:4,6,7,10; etc.), e ao afirmar explicitamente a autoridade das mesmas, dizendo em João 10:35 que "a Escritura não pode falhar."9


III. Usurpações da Autoridade das Escrituras

Apesar da sólida base bíblico-teológica em favor da doutrina reformada da autoridade suprema das Escrituras, hoje, como no passado, deparamo-nos com a mesma tendência geral de diminuir a autoridade das Escrituras. E isso ocorre de duas maneiras: por um lado, há a propensão em admitir fontes adicionais ou suplementares de autoridade, que tendem a usurpar a autoridade da Palavra de Deus. Por outro lado, há a tendência de limitar a autoridade das Escrituras, negando-a, subjetivando-a ou reduzindo o seu escopo.

Com relação à primeira dessas tendências, pelo menos três fontes suplementares usurpadoras da autoridade das Escrituras podem ser identificadas: a tradição (degenerada em tradicionalismo), a emoção (degenerada em emocionalismo) e a razão (degenerada no racionalismo). Sempre que um desses elementos é indevidamente enfatizado, a autoridade das Escrituras é questionada, diminuída ou mesmo suplantada.


A. A Tradição Degenerada em Tradicionalismo

Este foi um dos grandes problemas enfrentados pelo Senhor Jesus. A religião judaica havia se tornado incrivelmente tradicionalista. Havendo cessado a revelação, os judeus, já no segundo século antes de Cristo, produziram uma infinidade de tradições ou interpretações da Lei, conhecidas como Mishnah. Essas tradições foram cuidadosamente guardadas pelos escribas e fariseus por séculos, até serem registradas nos séculos IV e V A.D., passando a ser conhecidas como o Talmude,10 a interpretação judaica oficial do Antigo Testamento até o dia de hoje. Muitas dessas tradições judaicas eram, entretanto, distorções do ensino do Antigo Testamento.
Mas tornaram-se tão autoritativas, que suplantaram a autoridade do Antigo Testamento. Jesus acusou severamente os escribas e fariseus da sua época, dizendo:
Em vão me adoram, ensinando doutrinas que são preceitos de homens. Negligenciando o mandamento de Deus, guardais a tradição dos homens. E disse-lhes ainda: Jeitosamente rejeitais o preceito de Deus para guardardes a vossa própria tradição... invalidando a palavra de Deus pela vossa própria tradição que vós mesmos transmitistes... (Mc 7.7-9,13).11

O Apóstolo Paulo também denunciou essa tendência. Escrevendo aos colossenses, ele advertiu:
Cuidado que ninguém vos venha a enredar com
sua filosofia e vãs sutilezas, conforme a tradição dos homens, conforme os rudimentos do mundo, e não segundo Cristo... Se morrestes com Cristo para os rudimentos do mundo, por que, como se vivêsseis no mundo, vos sujeitais a ordenanças: Não manuseies isto, não proves aquilo, não toques aquiloutro, segundo os preceitos e doutrinas dos homens? (Cl 2.8,20-22).

Quinze séculos depois, os Reformadores se depararam com o mesmo problema: as tradições contidas nos livros apócrifos e pseudepígrafos, nos escritos dos pais da igreja, nas decisões conciliares e nas bulas papais também degeneraram em tradicionalismo. As tradições eclesiásticas adquiriram autoridade que não possuíam, usurpando a autoridade bíblica. É neste contexto que se deve entender a doutrina reformada da autoridade das Escrituras. Trata-se, primordialmente, de uma reação à posição da Igreja Católica.

Isto não significa, entretanto, que a tradição eclesiástica seja necessariamente ruim. Se a tradição reflete, de fato, o ensino bíblico, ou está de acordo com ele, não sendo considerada normativa (autoritativa) a não ser que reflita realmente o ensino bíblico, então não é má. Os próprios Reformadores produziram, registraram e empregaram confissões de fé e catecismos (os quais também são tradições eclesiásticas).

Para eles, contudo, esses símbolos de fé não têm autoridade própria, só sendo normativos na medida em que refletem fielmente a autoridade das Escrituras.
O problema, portanto, não está na tradição, mas na sua degeneração, no tradicionalismo, que atribui à tradição autoridade inerente. O tradicionalismo atribui autoridade às tradições, pelo simples fato de serem antigas ou geralmente observadas, e não por serem bíblicas. Essa tendência acaba sempre usurpando a autoridade das Escrituras.


B. A Emoção Degenerada em Emocionalismo

Outra fonte de autoridade que sempre ameaça a autoridade das Escrituras é a emoção, quando degenerada em emocionalismo. Isto quase inevitavelmente conduz ao misticismo. Na esfera religiosa, freqüentemente é dado um valor exagerado à intuição, ao sentimento, ao convencimento subjetivo. Quando tal ênfase ocorre, facilmente esse sentimento subjetivo de convicção, pessoal e interno, é explicado misticamente, em termos de iluminação espiritual e revelação divina direta, seja por meio do Espírito, seja pela instrumentalidade de anjos, sonhos, visões, arrebatamentos, etc.
Não é que Deus não tenha se revelado por esses meios. Ele de fato o fez. Foi, em parte, através desses meios que a revelação especial foi comunicada à Igreja e registrada no cânon pelo processo de inspiração. O que se está afirmando é que o misticismo copia, forja essas formas reais de revelação do passado, para reivindicar autoridade que na verdade não é divina, mas humana (quando não diabólica). Essa tendência não é de modo algum nova. Eis as palavras do Senhor através do profeta Jeremias:

Assim diz o Senhor dos Exércitos: Não deis ouvido às palavras dos profetas que entre vós profetizam, e vos enchem de vãs esperanças; falam as visões do seu coração, não o que vem da boca do Senhor... Até quando sucederá isso no coração dos profetas que proclamam mentiras, que proclamam só o engano do próprio coração?... O profeta que tem sonho conte-o como apenas sonho; mas aquele em quem está a minha palavra, fale a minha palavra com verdade. Que tem a palha com o trigo? diz o Senhor (Jr 23.16,26,28).

Séculos depois o Apóstolo Paulo enfrentou o mesmo problema. Ele próprio foi instrumento de revelações espirituais verdadeiras, inspirado que foi para escrever suas cartas canônicas. Nessa condição, ele sabia muito bem o que eram sonhos, visões, revelações e arrebatamentos. Mas, ainda assim, advertiu aos colossenses, dizendo: "Ninguém se faça árbitro contra vós outros, pretextando humildade e culto dos anjos, baseando-se em visões, enfatuado sem motivo algum na sua mente carnal" (Cl 2:18).

Tanto Jesus como os apóstolos advertem a Igreja repetidamente contra os falsos profetas, os quais ensinam como se fossem apóstolos de Cristo, mas que não passam de enganadores.
Pois bem, sempre que tal coisa ocorre, a autoridade das Escrituras é ameaçada. O misticismo, como degeneração das emoções (não se pode esquecer que também as emoções foram corrompidas pelo pecado) tende sempre a usurpar, a competir com a autoridade das Escrituras, chegando mesmo freqüentemente a suplantá-la.

Na época dos Reformadores não foi diferente. Eles combateram grupos místicos por eles chamados de entusiastas12 que reivindicavam autoridade espiritual interior, luz interior, revelações espirituais adicionais que suplantavam ou mesmo negavam a autoridade das Escrituras. Esta tem sido igualmente uma das características mais comuns das seitas modernas, tais como mormonismo, testemunhas de Jeová, adventismo do sétimo dia, etc. Entre os movimentos pentecostais e carismáticos também não é incomum a emoção degenerar em emocionalismo, produzindo um misticismo usurpador da autoridade das Escrituras.


C. A Razão Degenerada em Racionalismo

A ênfase exagerada na razão também tende a usurpar a autoridade das Escrituras. O homem, devido a sua natureza pecaminosa, sempre tem resistido a submeter sua razão à autoridade da Palavra de Deus. A tendência é sempre tê-la (a razão) como fonte suprema de autoridade. Isto foi conseqüência da queda. Na verdade, foi também a causa, tanto da queda de Satanás como de nossos primeiros pais. Ambos caíram por darem mais crédito às suas conclusões do que à palavra de Deus. Desde então, essa soberba mental, essa altivez intelectual tem tendido sempre a minar a autoridade da Palavra de Deus, oral (antes de ser registrada) ou escrita.
Por que o ser humano, tendo conhecimento de Deus, não o glorifica como Deus nem lhe é grato? O Apóstolo Paulo explica: porque, suprimindo a verdade de Deus (Rm 1:18), "...se tornaram nulos em seus próprios raciocínios, obscurecendo-se-lhes o coração insensato. Inculcando-se por sábios, tornaram-se loucos... pois eles mudaram a verdade de Deus em mentira, adorando e servindo a criatura, em lugar do Criador...’’ (Rm 1:21-22,25).

Esta tem sido, sem dúvida, a causa de uma infinidade de heresias e erros surgidos no curso da história da Igreja. A heresia de Marcião, o gnosticismo, o arianismo, o docetismo, o unitarianismo, e mesmo o arminianismo são todos erros provocados pela dificuldade do homem em submeter sua razão à revelação bíblica. Todos preferiram uma explicação racional, lógica, em lugar da explicação bíblica que lhes parecia inaceitável.

Assim, Marcião concebeu dois deuses, um do Antigo e outro do Novo Testamento. Por isso, também o gnosticismo fez distinção moral entre matéria e espírito. Já o arianismo originou-se da dificuldade de Ario em aceitar a eternidade de Cristo. Do mesmo modo, o docetismo surgiu da dificuldade de alguns em admitir um Cristo verdadeiramente divino-humano. O unitarianismo, por sua vez, decorre da recusa em aceitar a doutrina bíblica da Trindade, enquanto que o arminianismo surgiu da dificuldade de Armínio em conciliar a doutrina da soberania de Deus com a doutrina da responsabilidade humana (rejeitando a primeira).

A tendência da razão em usurpar a autoridade das Escrituras tem sido especialmente forte nos últimos dois séculos. O desenvolvimento científico e tecnológico instigou a soberba intelectual do homem. Assim, passou-se a acreditar apenas no que possa ser constatado, comprovado, pela razão e pela lógica.

A ciência tornou-se a autoridade suprema, a única regra de fé e prática. E a Igreja passou a fazer concessões e mais concessões, na tentativa de harmonizar as Escrituras com a razão e com a ciência. O relato bíblico da criação foi desacreditado pela teoria da evolução; os milagres relatados nas Escrituras foram rejeitados como mitos; e muitos estudiosos das Escrituras passaram a assumir uma postura crítica, não mais submissa aos seus ensinos. Foi assim que surgiu o método de interpretação histórico-crítico em substituição ao método histórico-gramatical. Nele, é a suprema razão humana que determina o que é escriturístico ou mera tradição posterior, o que é milagre ou mito, o que é verdadeiro ou falso nas Escrituras.

Mas antes de se atribuir tanta autoridade à ciência, convém considerar a sua história. Quão falível e mutável é! A grande maioria dos "fatos" científicos de dois séculos atrás já foram rejeitados pela própria ciência. Além disso, com que freqüência meras teorias e hipóteses científicas são tomadas como fatos científicos comprovados!13


IV. Limitações da Autoridade das Escrituras

Além das tendências que acabei de considerar, propensas a usurpar a autoridade das Escrituras, existem outras, que tendem a limitar a autoridade bíblica, negando-a, subjetivando-a ou reduzindo o seu escopo. É o que têm feito a teologia liberal, a neo-ortodoxia e o neo-evangelicalismo, com relação a três dos principais aspectos da doutrina da autoridade das Escrituras. Estas três concepções de "autoridade" bíblica precisam ser entendidas.
Elas estão sendo bastante divulgadas em nossos dias, e são, em certo sentido, até mais perigosas do que as tendências anteriormente mencionadas, por serem mais sutis. Este assunto pode ser melhor entendido considerando-se os três principais aspectos da doutrina da autoridade das Escrituras: sua origem (ou base), certeza (ou convicção) e escopo (ou abrangência).


A. Origem ou Base da Autoridade das Escrituras

A origem ou base da autoridade das Escrituras, como já foi mencionado, encontra-se na sua autoria divina. As Escrituras são autoritativas porque são de origem divina: o Espírito Santo é o seu autor primário. Para os Reformadores, as Escrituras são autoritativas porque são a Palavra de Deus inspirada. Por isso são infalíveis, inerrantes, claras, suficientes, etc.

A teologia liberal (racionalista) nega a própria base da autoridade da Escritura, negando a sua origem divina. Para ela, as Escrituras são mero produto do espírito humano, expressando verdades divinas conforme discernidas pelos seus autores, bem como erros e falhas características do homem.

Sua autoridade, portanto, não é divina nem inerente, mas humana, devendo ser determinada pelo julgamento da razão crítica. Eis o que afirmam: "A verdade divina não é encontrada em um livro antigo, mas na obra contínua do Espírito na comunidade, conforme discernida pelo julgamento crítico racional."14 De acordo com a teologia liberal, "nós estamos em uma nova situação histórica, com uma nova consciência da nossa autonomia e responsabilidade para repensar as coisas por nós mesmos. Não podemos mais apelar à inquestionável autoridade de um livro inspirado."15

B. Certeza da Autoridade das Escrituras

A certeza ou convicção da autoridade das Escrituras16 provém do testemunho interno do Espírito Santo. A excelência do seu conteúdo, a eficácia da sua doutrina e a sua extraordinária unidade são algumas das características das Escrituras que demonstram a sua autoridade divina. Contudo, admitimos que "a nossa plena persuasão e certeza da sua infalível verdade e divina autoridade provém da operação interna do Espírito Santo, que pela Palavra e com a Palavra, testifica em nossos corações."17

O testemunho da Igreja com relação à excelência das Escrituras pode se constituir no meio pelo qual somos persuadidos da sua autoridade, mas não na base ou fundamento da nossa persuasão. A nossa persuasão da autoridade da Bíblia dá-se por meio do testemunho interno do Espírito Santo com relação à sua inspiração. Na concepção reformada, se alguém crê, de fato, na autoridade suprema das Escrituras como regra de fé e prática, o faz como resultado da ação do Espírito Santo.

É ele, e só ele, quem pode persuadir alguém da autoridade da Bíblia.
Essa persuasão não significa de modo algum uma revelação adicional do Espírito. Significa, sim, que a ação do Espírito na alma de uma pessoa, iluminando seu coração e sua mente em trevas, regenerando-a, fazendo-a nova criatura, dissipa as trevas espirituais da sua mente, remove a obscuridade do seu coração, permitindo que reconheça a autoridade divina das Escrituras.

O Apóstolo Paulo trata deste assunto escrevendo aos coríntios. Ele explica, na sua primeira carta, que, "o homem natural não aceita as cousas do Espírito de Deus, porque lhe são loucura; e não pode entendê-las porque elas se discernem espiritualmente" (1 Co 2.14). O homem natural, em estado de pecado, perdeu a sua capacidade original de compreender as coisas espirituais. Ele não pode, portanto, reconhecer a autoridade das Escrituras; ele não tem capacidade para isso.

Na sua segunda carta aos coríntios o Apóstolo é ainda mais explícito, ao observar que,
...se o nosso evangelho ainda está encoberto, é para os que se perdem que está encoberto, nos quais o deus deste século cegou os entendimentos dos incrédulos, para que lhes não resplandeça a luz do evangelho da glória de Cristo, o qual é a imagem de Deus... Porque Deus que disse: de trevas resplandecerá luz —, ele mesmo resplandeceu em nossos corações, para iluminação do conhecimento da glória de Deus na face de Cristo (2 Co 4.3-4,6).

O que Paulo afirma aqui é que o homem natural, o incrédulo, está cego como resultado da obra do diabo, que o fez cair. Nesse estado, ele está como um deficiente visual, que não consegue perceber nem mesmo a luz do sol. Pode-se compreender melhor o testemunho interno do Espírito com esta ilustração.

O testemunho do Espírito não é uma nova luz no coração, mas a sua ação através da qual ele abre os olhos de um pecador, permitindo-lhe reconhecer a verdade que lá estava, mas não podia ser vista por causa da sua cegueira espiritual.
Deve-se ter em mente, entretanto — e esse é o ponto enfatizado aqui —, que esse testemunho interno do Espírito Santo diz respeito à certeza do crente com relação à plena autoridade das Escrituras, e não à própria autoridade inerente das Escrituras. A convicção de um crente de que as Escrituras têm autoridade é subjetiva, mas a autoridade das Escrituras é objetiva. Esteja-se ou não convencido da sua autoridade, a Bíblia é e continua objetivamente autoritativa.

A neo-ortodoxia existencialista confunde estas coisas e defende a subjetividade da própria autoridade da Bíblia. Para eles, a revelação bíblica só é verdade divina quando fala ao nosso coração. Como dizem, "as Escrituras não são, mas se tornam a Palavra de Deus" quando existencializadas.18


C. Escopo da Autoridade das Escrituras

Essas posições da teologia liberal e da neo-ortodoxia com relação à origem e à certeza da autoridade das Escrituras são seríssimas. Contudo, talvez mais séria ainda (por ser mais sutil) é a questão relacionada ao escopo da autoridade das Escrituras.
Uma nova concepção da autoridade das Escrituras tem surgido entre os eruditos evangélicos (inclusive reformados de renome, tais como G. C. Berkouwer19), conhecida como neo-evangélica. O neo-evangelicalismo limita o escopo (a área) da autoridade das Escrituras ao seu propósito salvífico. Segundo essa concepção, a autoridade das Escrituras limita-se à revelação de assuntos diretamente relacionados à salvação, a assuntos religiosos.20

A doutrina neo-evangélica faz diferença entre o conteúdo salvífico das Escrituras e o seu contexto salvífico, reivindicando autoridade e inerrância apenas para o primeiro. Mas tal posição não reflete nem se coaduna com a posição reformada e protestante histórica.

Para esta, o escopo da autoridade das Escrituras é todo o seu cânon. É verdade que a Bíblia não se propõe a ser um compêndio científico ou um livro histórico. Mas, ainda assim, todas as afirmativas nelas contidas, sejam elas de caráter teológico, prático, histórico ou científico, são inerrantes e autoritativas.21

Os principais problemas relacionados com a posição neo-evangélica quanto à autoridade das Escrituras são os seguintes: Primeiro, como distinguir o conteúdo salvífico do seu contexto salvífico? É impossível.

As Escrituras são a Palavra de Deus revelada na história. Segundo, como delimitar o que está ou não está diretamente relacionado ao propósito salvífico, se o propósito da obra da redenção não é meramente salvar o homem, mas restaurar o cosmo? Que porções das Escrituras ficariam de fora do escopo da salvação? Como Ridderbos admite, "a Bíblia não é apenas o livro da conversão, mas também o livro da história e o livro da Criação..."22

Que áreas da vida humana ficariam de fora da obra da redenção? A arte, a ciência, a história, a ética, a moral? Quem delimitaria as fronteiras entre o que está ou não incluído no propósito salvífico? Admitir, portanto, o conceito neo-evangélico de autoridade das Escrituras é cair na cilada liberal do cânon dentro do cânon, e colocar a razão humana como juiz supremo de fé e prática, pois neste caso competirá ao homem determinar o que é ou não propósito salvífico.


Conclusão

Em última instância, a questão da autoridade das Escrituras pode ser resumida na seguinte pergunta: quem tem a última palavra, Deus, falando através das Escrituras, ou o homem, por meio de suas tradições, sentimentos ou razão? A resposta dos Reformadores foi clara. Embora reconhecendo que o propósito especial das Escrituras não é histórico, moral ou científico, mas salvífico, eles não diminuíram a sua autoridade de forma alguma: nem por adições ou suplementos, nem por reduções ou limitações de qualquer natureza. A fé reformado-puritana reconhece a autoridade de todo o conteúdo das Escrituras, e sua plena suficiência e suprema autoridade em matéria de fé e práticas eclesiásticas.

Tão importante foi a redescoberta destas doutrinas pelos Reformadores, que pode-se afirmar que, da aplicação prática das mesmas, decorreu, em grande parte, a profunda reforma doutrinária, eclesiástica e litúrgica que deu origem às igrejas protestantes. Todas as doutrinas foram submetidas à autoridade das Escrituras. Todos os elementos de culto, cerimônias e práticas eclesiásticas foram submetidos ao escrutínio da Palavra de Deus.

A própria vida (trabalho, lazer, educação, casamento, etc.) foi avaliada pelo ensino suficiente e autoritativo das Escrituras. Muito entulho doutrinário teve que ser rejeitado. Muitas tradições e práticas religiosas acumuladas no curso dos séculos foram reprovadas quando submetidas ao teste da suficiência e da autoridade suprema das Escrituras. E a profunda reforma religiosa do século XVI foi assim empreendida.

Mas muito tempo já se passou desde então. O evangelicalismo moderno recebeu, especialmente do século passado, um legado teológico, eclesiástico e litúrgico que precisa ser urgentemente submetido ao teste da doutrina reformada da autoridade suprema das Escrituras. É tempo de reconsiderar as implicações desta doutrina. É tempo de reavaliar a nossa fé, nossas práticas eclesiásticas e nossas próprias vidas à luz desta doutrina. Afinal, admitimos que a Igreja reformada deve estar sempre se reformando — não pela conformação constante às últimas novidades, mas pelo retorno e conformação contínuos ao ensino das Escrituras.

Sabendo que a nossa natureza pecaminosa nos impulsiona em direção ao erro e ao pecado, conhecendo o engano e a corrupção do nosso próprio coração, reconhecendo os dias difíceis pelos quais passa o evangelicalismo moderno (particularmente no Brasil), e a ojeriza doutrinária, a exegese superficial e a ignorância histórica que em grande parte caracterizam o evangelicalismo moderno no nosso país, não temos o direito de assumir que nossa fé e práticas eclesiásticas sejam corretas, simplesmente por serem geralmente assim consideradas. É necessário submeter nossa fé e práticas eclesiásticas à autoridade suprema das Escrituras.


assim fazendo, não é improvável que nós, à semelhança dos Reformadores, também tenhamos que rejeitar considerável entulho teológico, eclesiástico e litúrgico acumulados nos últimos séculos. Não é improvável que venhamos a nos surpreender, ao descobrir um evangelicalismo profundamente tradicionalista, subjetivo e racionalista. Mas não é improvável também que venhamos a presenciar uma nova e profunda reforma religiosa em nosso país. Que assim seja!


English Abstract
In this article on reformed theology Anglada deals with the reformed doctrine of the supreme authority of Scripture. Assuming a theological, ecclesiastical and liturgical crisis in modern evangelicalism, particularly in Brazil, he summarizes the biblical basis of the doctrine, and alerts against the old and new tendencies of usurping or limiting the authority of God’s Word. Among the usurping tendencies against the authority of Scripture, he includes the ecclesiastical traditions degenerated into traditionalism, emotions degenerated into emotionalism, and reason degenerated into rationalism. Among the limiting tendencies he mentions the liberal negation of the very foundation of Biblical authority, the neo-orthodox confusion concerning the certainty of the authority of Scripture, and the neo-evangelical limitation of the scope of its authority. He concludes the article by calling attention to the importance of the doctrine in the sixteenth-century Reformation and by suggesting that if the modern evangelical faith and ecclesiastical practices were subjected to the scrutiny of this doctrine, a considerable number of doctrines and ecclesiastical practices would have to be rejected, and a new reformation would take place. __________________________
Notas
* Este artigo foi originalmente publicado na revista Fides Reformata 2:2 (1997).
** Paulo Anglada. O autor é ministro presbiteriano, professor de Grego e Hermenêutica no Seminário Teológico Batista Equatorial e presidente da Associação Reformada Palavra da Verdade, na cidade de Belém. É mestre em Teologia pela Potchefstroom University for Christian Higher Education (África do Sul) e doutorando em Ministério no Westminster Theological Seminary, na Califórnia.

1 Ver, por exemplo, William Ames, A Fresh Suit against Human Ceremonies in God’s Worship (Rotterdam, 1633); David Calderwood, Against Festival Days, 1618 (Dallas: Naphtali Press, 1996); George Gillespie, Dispute against the English Popish Ceremonies Obtruded on the Church of Scotland (Edinburgh: Robert Ogle and Oliver & Boyd, 1844); e John Owen, "A Discourse concerning Liturgies and their Impositions," em The Works of John Owen, vol. 15 (Edinburgh: The Banner of Truth Trust, 1965).
2 Cf. John MacArthur Jr., Com Vergonha do Evangelho: Quando a Igreja se torna como o Mundo (São José dos Campos: Editora Fiel, 1997) e Paulo Romeiro, Evangélicos em Crise: Decadência Doutrinária na Igreja Brasileira (São Paulo: Mundo Cristão, 1995).
3 Ver capítulo sobre a "Consciência Puritana," em J. I. Packer, Entre os Gigantes de Deus: Uma Visão Puritana da Vida Cristã (São José dos Campos: Editora Fiel, 1991), 115-132.
4 Sobre o conceito reformado de inspiração e infalibilidade (inerrância) das Escrituras, ver L. Berkhof, Introducción a la Teología Sistemática (Grand Rapids: The Evangelical Literature League, [1973]), 159-190; A. A. Hodge, Evangelical Theology: A Course of Popular Lectures (Edinburgh and Pennsylvania: The Banner of Truth Trust, 1976), 61-83; Loraine Boettner, Studies in Theology (Phillipsburg and New Jersey: Presbyterian and Reformed Publishing Company, 1978), 9-49; e J. C. Ryle, Foundations of Faith: Selections From J. C. Ryle’s Old Paths (South Plainfield, New Jersey: Bridge Publishing, 1987), 1-39.
5 Cf. também Salmo 119.39, 43, 62, 75, 86, 89, 106, 137, 138, 142, 144, 160, 164, 172; Mateus 24.34; João 17.17; Tiago 1.18; Hebreus 4.12 e 1 Pedro 1.23,25.
6 Lloyd-Jones afirma que essas expressões são usadas 3.808 vezes no Antigo Testamento; e que os que assim se expressavam estavam deixando claro que não expunham suas próprias idéias ou imaginações. D. Martin Lloyd-Jones, Authority (Edinburgh and Pennsylvania: The Banner of Truth Trust, 1984), 50.
7 Ver também Atos 28.25 e Hebreus 4.3, 5.6 e 10.15-16.
8 O termo empregado é gegraptai. O tempo perfeito indica uma ação realizada no passado, cujos resultados permanecem no presente: foi escrito e permanece válido, falando com autoridade.
9 Outras evidências da autoridade divina das Escrituras são apresentadas por Lloyd-Jones, Authority, 30-50; e por John A. Witmer, "The Authority of the Bible," Bibliotheca Sacra 118:471 (July 1961): 264-27.
10 O Talmud inclui também a Gemara, comentários rabínicos sobre o Mishnah, escritos entre 200 e 500 AD (C. L. Feinberg, "Talmude e Midrash," em J. D. Douglas, ed., O Novo Dicionário da Bíblia, vol. 3 (São Paulo: Edições Vida Nova, 1979), 1560-61.
11 Conferir também Mateus 15.3ss.
12 Berkhof, Introducción a la Teología Sistemática, 207.
13 Um exemplo bem atual: há poucos dias atrás, cientistas anunciaram que pesquisas feitas com o DNA dos fósseis do assim chamado homem de Neanderthal — até então "inquestionavelmente" considerado um dos antepassados mais recentes do homem na cadeia evolutiva —, revelam que esses ossos nada têm a ver com a raça humana. Exemplos como estes repetem-se continuamente, e deveriam tornar-nos cautelosos em atribuir à ciência autoridade maior do que a da revelação bíblica.
14 C. Pinnock, citado por Keun-Doo Jung, "A Study of the Authority with Reference to The Westminster Confession of Faith." (Tese de Mestrado, Potchefstroom [South Africa] University for Christian Higher Education, 1981), 45.
15 G. D. Kaufman, ibid., 45.
16 Ensinada no parágrafo V do capítulo I da Confissão de Fé de Westminster.
17 Ibid.
18 Outros dados sobre a importância da doutrina reformada da autoridade das Escrituras em relação à teologia liberal e à neo-ortodoxia podem ser obtidos em Lloyd-Jones, Authority, 30-61; John A. Witmer, "Biblical Authority in Contemporary Theology," Bibliotheca Sacra 118:469 (January 1961), 59-67; e Kenneth S. Kantzer, "Neo-Orthodoxy and the Inspiration of Scripture," Bibliotheca Sacra 116:461 (January 1959), 15-29.
19 Ver G. C. Berkouwer, Studies in Dogmatics: Holy Scripture (Grand Rapids: Eerdmans, 1975) e Ronald Gleason, "In Memoriam: Dr. Gerrit Cornelius Berkouwer," Modern Reformation 5:3 (May/June 1996), 30-32.
20 Alguns eruditos têm considerado a doutrina reformada tradicional da autoridade das Escrituras conforme ensinada pelos teólogos de Princeton, tais como Charles Hodge (1797-1878), Alexander Hodge (1823-1886) e B. B. Warfield (1851-1921), como um desvio do ensino dos Reformadores e da Confissão de Fé de Westminster. Ver, por exemplo, Ernest Sandeen, The Roots of Fundamentalism: British and American Millenarianism, 1800-1930 (Chicago: University of Chicago Press, 1970). Alguns, como Jack Rogers e Donald McKim, The Authority and Interpretation of the Bible: A Historical Approach (San Francisco: Harper & Row, 1979), chegam a defender que a doutrina reformada das Escrituras encontra seus legítimos representantes em Abraham Kuyper (1837-1920) e Herman Bavinck (1854-1921), os quais teriam se antecipado aos esforços de Karl Barth e G. C. Berkouwer no sentido de restaurar a verdadeira tradição reformada. Outros, entretanto, têm demonstrado que estas teses não procedem, visto que os teólogos de Princeton estão em substancial harmonia com outros que os antecederam, e com Kuyper e Bavinck. Ver Randall H. Balmer, "The Princetonians and Scripture: A Reconsideration," Westminster Theological Journal 44:2 (1982): 352-365; e Richard B. Gaffin, Jr., "Old Amsterdam and Inerrancy?," Westminster Theological Journal 44:2 (1982), 250-289; 45:2 (1983): 219-272.
21 Uma demonstração da posição reformada e protestante histórica da inerrância das Escrituras em português pode ser encontrada em John H. Gerstner, "A Doutrina da Igreja sobre a Inspiração Bíblica," em James Montgomery Boice, ed., O Alicerce da Autoridade Bíblica, 2a ed. (São Paulo: Vida Nova, 1989), 25-68.
22 Herman Ridderbos, Studies in Scripture and its Authority (Grand Rapids:
Leitura Obrigatória para os alunos do Seminário Teológico do Sul - S.T.S

A HERMENÊUTICA DE CALVINO: O HOMEM E SUA HERMENÊUTICA



Por Martorelli Dantas

A forma como você pensa e interpreta o mundo ao seu redor não é, absolutamente, individual. Ela é a resultante de inúmeras influências que pesam sobre você, e que foram se acumulando com o passar dos anos. Assim cada indivíduo é capaz de fazer interpretações distintas do mesmo objeto, porque as ferramentas que ele utiliza para interpretar são partes do que ele é. Talvez fosse mais apropriado dizer que ele interpreta com tudo o que é.


Porém, é possível “uniformizar”, ou adotar como padrão um determinado método de interpretação. É possível aprender procedimentos que devem ser observados ao por em análise um texto. Como João Calvino (1509-1564), o reformador francês, é um dos mais influentes pensadores de nossa herança teológica; e toda teologia é simultaneamente mãe e filha da Hermenêutica (mãe, porque o que cremos exerce influência em como interpretamos; filha, porque aquilo que interpretamos fortalece e fundamenta o que cremos), creio ser de todo apropriado, empreendermos uma pesquisa sobre a Hermenêutica de Calvino.


Este será o objetivo do presente artigo, conhecer melhor como o Reformador de Genebra interpretava, e o porquê deste agir hermenêutico. Estou consciente que este objetivo não será desenvolvido com a abrangência necessária na presente obra, mas fica a proposta e o desafio de conhecermos melhor o homem e sua hermenêutica, posto que, sem dúvida, o estudo da interpretação realizada no passado, abre um porta para o conhecimento do indivíduo já distante no presente.


As Fontes que Influenciaram o Método Hermenêutico de Calvino


Como afirmamos desde o início, a maneira como interpretamos o mundo ao nosso redor e, por conseguinte, os textos que nos chegam às mãos (a Bíblia não está fora deste conjunto), é determinada por aquilo que somos, e o que somos é esta interminável síntese de distintas influências, que coabitando no nosso interior geram nossa individualidade. Destacaremos em seguida dois momentos da história da Hermenêutica que chegaram a Calvino e o influenciaram quer positiva, quer negativamente, apresentando a ele ora um caminho por onde seguir, ora assinalando veredas a serem evitadas.

1. A Hermenêutica Medieval.


Calvino, nascido no início do século XVI, vê ao seu redor um mundo infestado pela interpretação alegórica das Escrituras. Esta fora a hermenêutica dominante durante a Idade Média, muito embora haja dignos exemplos de teólogos que valorizavam o sentido literal do texto, o sentido mais “simples”, aquele pretendido pelo autor humano. Homens como o teólogo judeu Rashi; Hugo, Ricardo e André da Abadia de São Vitor; Nicolau de Lira (que exerceu grande influência sobre Lutero) e, é claro, João Wycliffe, são exemplos de pensadores, que mesmo em face da predominância da visão do quádruplo sentido da Escritura (histórico, alegórico, tropológico e anagógico)[1][1], defenderam e usaram aquilo que poderia ser descrito como uma hermenêutica histórico-gramatical incipiente.

Parece-me importante destacar que a dialética entre a interpretação e a dogmática, já referida acima, esteve presente de forma decisiva na hermenêutica medieval. Se alegorizavam os teólogos da chamada Era das Trevas, não o faziam sem uma agenda de compromissos de dois níveis principais.


Por uma lado, a teologia herdada dos Pais da Igreja, que recebe pouco desenvolvimento neste período, com exceção da Eclesiologia que ganha novos e amplos contornos; por outro lado a política. Não devemos nos esquecer que a Igreja Medieval é um “império”, ou melhor, o Império. Que pervagava todos os demais, não raramente de forma tirânica e dominante. Não existe poder político sem ideologia, a ideologia do império Católico Romano é a sua própria teologia, e é na construção testa teologia de sustentação que se engaja a alegorese medieval.


Este assunto ganha uma importância quase dramática, porque a obra teológica de Calvino não se vê livre desta relação dialética entre interpretação e teologia de sustentação do poder, muito embora seus compromissos sejam bem outros, ele também produz uma teologia que legitima um estado (e que se contrapõe a um outro) e que é alimentada pela ideologia deste estado, que é, poderíamos dizer, o estado burguês.


2. A Hermenêutica de Lutero


Entre a hermenêutica medieval e a obra de Calvino, devemos situar o trabalho e Martinho Lutero (1438-1546). Lutero é um interprete da renascença[2][2] européia. Com o afã de viver de acordo com o modelo de Agostinho (354-430), Lutero, assim como muitos dos seus contemporâneos, empreendeu uma investigação da obra filosófica grega e dedicou-se ao estudo do Novo Testamento em sua língua original. Este empreendimento, aliado à influência já referida dos vitorinos e da escola de Antioquia, que se digladiou durante o segundo e quarto séculos com a escola de Alexandria (esta defensora da alegorese, aquela de uma interpretação mais literal do texto bíblico), fez com que Lutero assumisse uma postura revolucionária em seus dias.

Bernard Ramm, em seu Protestant Biblical Interpretation, afirma que a Reforma do Séc. XVI, foi essencialmente uma reforma hermenêutica, “uma reforma na maneira de ver a Bíblia”.[3][3] Não é uma tarefa das mais fáceis analisar as razões motivadoras da hermenêutica de Lutero, já que ele e a própria Reforma ganharam um nível sagrado para a comunidade protestante dos nossos dias e, não raro, são tratados com reverência quase mística (o mesmo poderia ser dito acerca de Calvino e sua obra).


Mas é preciso que tenhamos em mente que a Reforma fez parte de um processo mais amplo de mudanças que se deram na ordem mundial naquele século. A Reforma seria o braço religioso, e portanto teológico, da estruturação do Estado Moderno.


Com a Reforma a Bíblia toma o lugar que antes pertencera a hierarquia Católico Romana. Não é mais o Magistério quem determina o que deve ou não ser observado, o que deve ou não ser recebido como mandamento divino, agora quem faz isso é a própria Bíblia (claro que sob as lentes dos teólogos reformados).


Aqui há nitidamente uma mudança do eixo do poder religioso, o qual deixa de estar centrado num determinado grupo de indivíduos e passa a estar sobre documentos (a Bíblia), que devem ser examinados e interpretados “livremente” por qualquer um. Daí a importância da doutrina da perspicuidade da Escritura, a qual afirma que qualquer pessoa pelo uso dos meios ordinários de interpretação, pode chegar ao conhecimento do conteúdo do que ensina a Palavra de Deus.
Lutero não se viu livre da alegoria, antes, por vezes, fez uso da mesma para explicar suas conclusões exegéticas (leia-se o segundo comentário de Lutero à Carta aos Gálatas, onde isto fica patente).


Ele é um homem de transição, como em certo sentido também o é Calvino, haja vista a teologia da ortodoxia protestante do século de XVII. Seu trabalho, contudo, trouxe inestimáveis contribuições à igreja cristã, destacando-se muito mais sua coragem e piedade, que em seu brilhantismo intelectual. Ele é sem dúvida um marco do resgate moderno[4][4] do método histórico-gramatical[5][5], embora não seja um de seus melhores exemplos.


Calvino e seu uso do método Histórico-Gramatical


Chegamos a Calvino, e deste momento em diante tentaremos apontar os tópicos que parecem ser suas principais preocupações no trato dos textos bíblicos e na formulação de sua teologia. Calvino faz um uso mais desenvolvido do método histórico-gramatical. Ele tenta levá-lo às últimas conseqüências e manter uma coerência metodológica ao analisar textos do Novo e do Antigo Testamento. Por estas razões não é exagero dizer que ele foi o maior pensador de seus dias e o grande exegeta da Reforma.

Com um excelente preparo acadêmico, versado nos escritos dos pais latinos e na filosofia grega, afeiçoado às línguas originais e em constante “diálogo” com os pensadores de sua época, Calvino pode legar à Igreja um conjunto de obras que norteiam ainda hoje a fé Reformada, e que excede em equilíbrio, seriedade e profundidade à dos seus predecessores diretos e de seus seguidores nos séculos posteriores ao seu. Daí, entendermos ser muito mais salutar, se queremos resgatar as origens de nossa fé presbiteriana, retornarmos ao próprio Calvino, que à escolástica protestante ou à obra puritana[6][6].


Aqui vamos resumir em máximas de interpretação, as preocupações que Calvino demonstrou ao redigir seus comentários bíblicos (ele comentou quase todos os livros do NT, com exceção de 2 e 3 João e Apocalipse, além de muitos livros do AT):


Princípios da Hermenêutica de Calvino


1. Renúncia à alegorese e enfática denúncia da mesma como sendo uma arma de deturpação do sentido da Escritura
Ao desenvolver sua teologia Calvino fazia menção à interpretações alegóricas desenvolvidas pela igreja papista durante os séculos difíceis da Idade Média, e mesmo por pais da igreja que desenvolveram teses insustentáveis exegético e teologicamente. Nestas referências ele denunciava de forma quase virulenta a alegorese, forma ilegítima de buscar o real sentido da Palavra revelada. Não raro, Calvino chamava tais interpretações de “ficções”, e com isto ele pretendia expressar que a origem de tais interpretações era a imaginação do intérprete e não a revelação do Divino.


Desta prática apologética de Calvino, podemos apreender que para a adequada utilização do método histórico-gramatical, o intérprete deve deixar o texto falar por si só. Deve, na medida do possível, impedir que sua própria inventiva projete sobre o texto significados e afirmações que nele não subjazem.


2. Ênfase no sentido literal do texto
Calvino defende que cada texto tem um, e somente um, sentido, que é aquele pretendido pelo autor humano. Este sentido pode ser percebido pela leitura simples da Escritura. A forma mais comum de entendermos o que pretendia dizer o autor sacro, é buscar no sentido literal da passagem.
Vale, porém, lembrar que Calvino não era como ele mesmo designava, um “literalista”, aqueles que desprovido de bom senso, criam que todo texto deva ser interpretado de forma literal. Ele esclarecia aos seus leitores que há passagens que são nitidamente figurativas e outras simbólicas, estas devem ser interpretadas como demonstra ser a intenção do autor. Ele é categórico ao afirmar que a tipologia do texto pode ser percebida mesmo por indoutos em uma rápida leitura da passagem, e que aqueles ignoram isso o fazem devido à distorções de seus próprios espíritos perversos.
3. Dependência da operação do Espírito Santo para a correta interpretação da Bíblia


Na ótica calvinista, é tríplice a ação do Espírito em relação à Escritura. Em primeiro lugar, Ele inspirou os autores sacros, colocando em seus corações aquilo que pretendia fosse registrado para a posteridade e, principalmente, impedindo que ao registrar tais verdades, fossem inseridas máculas ou desvios provenientes da falibilidade do instrumento (o homem); em segundo lugar, ele preservou e preserva através dos séculos pura a sua Palavra para benefício e instrução da igreja, impedindo de forma miraculosa, que a verdade fosse distorcida ou omitida; e em terceiro lugar, Ele age hoje sobre os seus ministros, iluminando suas mentes para que compreendam corretamente o significado e as várias aplicabilidades[7][7] dos textos, para a benção e edificação do povo de Deus. desta forma, é impossível, pensava Calvino, e nós cremos ainda hoje, fazer adequada interpretação e pregação da Palavra, sem a dependência absoluta do Espírito Santo de Deus.


4. Valorização do estudo das línguas originais para melhor compreensão do ensino sagrado


Conquanto Calvino cresse na intervenção e auxílio do Espírito para a correta interpretação da Sacra Letra, ele jamais desprezou ou minimizou a importância do contínuo e cuidadoso estudo das línguas originais. Como já afirmei acima, o reformador de Genebra era versado em grego, hebraico e aramaico, além de possuir total domínio do latim e do francês, pelo menos.

Lendo as Institutas e seus comentários de livros de ambos os Testamentos, encontramos Calvino não apenas se referindo às palavras na língua original em que o texto foi escrito, mas também descendo a detalhes como o significado da conjugação de um verbo ou do modo de um dado substantivo. Tais conhecimentos são úteis e importantes para uma benfadada prática hermenêutica[8][8], chegando mesmo a Confissão de Fé de Westminster consagrá-los como “supremo tribunal” para que sejam dirimidas dúvidas.


5. Tipologia equilibrada, evitando impor a textos veterotestamentários simbolismos que eles não suportam


Na teologia há que se fazer uso de tipologias, que consiste em perceber que determinadas realidades do Antigo ou do Novo Testamento podem, corretamente, ser apropriadas como representações de verdades sublimes. Lutero no afã de demonstrar que Cristo está presente em toda a Bíblia, de Gêneses à Apocalipse, por vezes fez temerárias apropriações. Quase que impondo significados cristológicos a textos onde, provavelmente, não era esta a intenção Espírito e do autor (que são sempre a mesma).


Tal prática não pode ser encontrada na obra de Calvino, destarte o delicado momento histórico em que ele viveu. É digno de nota o fato de que para Calvino toda a Escritura aponta para Cristo, mas ele não está tipologicamente figurado em toda passagem da Escritura, como pretenderam alguns medievais e, em menor medida, Lutero.


6. A melhor arma para interpretar a Bíblia é a própria Bíblia


Este tem sido considerado o princípio áureo da hermenêutica reformada. Ele reza que os textos menos claros da Escritura sejam interpretados à luz dos textos mais claros. Esta é a prática generalizada de Calvino em todos os seus escritos. Sua primeira opção é sempre conferir textos paralelos que tratam do mesmo assunto.


Um exemplo disso, aparece quando comentando no quarto livro a dimensão herética que tomara a prática de ungir os enfermos, degenerando na unção in extremis (extrema unção), ele chama à memória o texto de Mc. 6:13, onde está registrado que os apóstolos na ministração de cura aos enfermos de diferentes aldeias e povoados por onde passaram em cumprimento de uma comissão dada pelo próprio Senhor Jesus, fizeram uso da unção com óleo, lembrando ainda que ao curar um cego Jesus fez lodo com saliva e areia, ungiu os olhos enfermos, curando-o.


Findando por relembrar que no Antigo assim como no Novo Testamento o óleo simboliza o Espírito Santo.
Desta forma, o grande mestre de Genebra, mesmo entendendo que a prática da extrema unção era prejudicial e promovida, freqüentemente, pelo misticismo pernicioso, ele não desvirtua o sentido simples dos textos em questão, antes os analisa com transparência, porém alertando para o mau uso que vinha sendo dado à esta prática no meio da igreja romanista.


Conclusão.


A aplicabilidade do Método Histórico-Gramatical em nossos dias e em nossas igrejas
Findamos, conclamando aos irmãos que professam serem reformados e calvinistas á prática de um exercício hermenêutico pautado nos padrões da interpretação histórico-gramatical. O acatamento de tal ação garantirá a nossa igreja um pensamento teológico coerente, firme e fiel. Em meio a tantos ventos de doutrina, precisamos definir não apenas o que pensamos de forma ortodoxa e clara, mas também como chegaremos a tais conclusões.


Nossa igreja é fundada numa tradição teológico-exegética que transcende os limites do tempo e do lugar. Para termos certeza que os nossos filhos receberão de nossas mãos uma igreja fiel, não poderemos abrir mão do método histórico-gramatical, recomendo para tal a observação dos princípios expostos, os quais fizeram parte da interpretação de Calvino e se transformaram na hermenêutica calvinista.

[1][1] Sob influência de João Cassiano (360-435) que ensinou em uma célebre quadra: “Littera gesta docet, Quid credas allegoria, Moralis quid agas, Quo tendas anagogia.” Que poderia ser traduzido como: A letra nos mostra o que aconteceu; a alegoria, no que devemos crer; a moral (sentido tropológico), como devemos viver; a anagogia, para onde estamos indo.
[2][2] A Renascença foi um movimento cultural, nascido na Itália do século XIV, que objetivava resgatar a literatura, a cultura e a filosofia clássicas (greco-romana).
[3][3] P.52
[4][4] Utilizamos aqui a expressão “moderno” em seu sentido histórico-filsófico, período que tem início com eventos como a Reforma do séc. XVI entre outros.
[5][5] Quando nos referimos neste artigo ao Método Histórico-Gramatical, falamos sobre o método consagrado na Reforma Protestante do Séc. XVI (embora existente, pelo menos, desde a hermenêutica judaica do séc. II A.C.), no qual prioriza-se o sentido simples do texto, aquele revelado pela leitura direta da passagem em seu sentido prioritariamente literal e é elucidado pela realidade histórica em que o mesmo foi escrito.
[6][6] Com isso não deixamos de reconhecer a importância de ambos os momentos de nossa caminhada teológica.
[7][7] Muito embora creiamos que cada texto possui um e somente um sentido, que é aquele pretendido pelo autor, estamos igualmente convencidos que este sentido possui inúmeras aplicações em incontáveis contextos diferentes.
[8][8] CFW I:VIII “O Velho Testamento em Hebraico (língua vulgar do antigo povo de Deus) e o Novo Testamento em Grego (a língua mais geralmente conhecida entre as nações no tempo em que ele foi escrito), sendo inspirados imediatamente por Deus e pelo seu singular cuidado e providência conservados puros em todos os séculos, são por isso autênticos e assim em todas as controvérsias religiosas a Igreja deve apelar para eles como para um supremo tribunal....”


Seminário Teológico do Sul - S.T.S.

FAZEDORES DE TENDA FAZEDORES DE DISCÍPULOS.

GREENWOOD, John Philip. Fazedores de Tendas Fazedores de Discípulos. Londrina: Editora Descoberta, 2005 p.160

Philip John Greenwood reside no interior de São Paulo com sua esposa Jan e com seus filhos Luke Rebeca e Kathryn. Ele é formado em engenharia química na Inglaterra e durante 13 anos exerceu a sua profissão.

Ele e sua esposa são ingleses e são missionários da “Latin Link Europe” desde 1992 e trabalham com a Aliança Universitária do Brasil nas áreas de discipulado e ensino. Philip e Jan estudaram no curso de missões transculturais no “ All Nations Chistian College”, na Inglaterra.

Philip fez seu mestrado no campo da Teologia Prática aqui no Brasil na FTSA Faculdade Teológica Sul América na cidade de Londrina PR. Seu livro é baseado justamente na sua dissertação de conclusão do curso

O autor divide o seu livro em cinco capítulos que nos levam a ter uma consciência clara do ministério emergente dos “ fazedores de Tenda. O capítulo primeiro ele “ apresenta o ministério dos Fazedores de Tendas”. O segundo capítulo ele nos leva para “ Uma perspectiva bíblica e Teológica do tema”. O terceiro capítulo ele nos leva para uma reflexão do educador Paulo Freire e do Teólogo René Padilha fazendo uma junção educacional teológica “ Freire e Padilha: Uma pedagogia para contextos de opressão e a Missão Integral da Igreja”. O quarto capítulo ele trabalha “ A realidade desafiadora do mundo e a preparação missionária no Brasil”. O quinto e último capítulo o autor traz “ Uma proposta de Modelos Contextualizados”

O autor inicia dizendo que as regiões do mundo que dentro do âmbito histórico mais tem enviado missionários transculturais estão a cada dia se tornando uma sociedade pluralista, cética e intolerante a fé cristã. Os Estados Unidos e o continente Europeu as igrejas cristãs tem enfrentado uma grande resistência a missões transculturais.

Por outro lado diz o autor os países do mundo dos Dois Terços têm em muito aumentado a sua força missionária, porém os recursos financeiros tem inibido e limitado o seu impacto de missões cristãs.

Para suprir esse realismo várias estratégias tem sido elaborada e uma que tem sido percebida e ventilada ao longo prazo é o ministério dos fazedores de tendas que é justamente o envio de profissionais para aquelas regiões menos alcançadas do mundo. Ali esses missionários podem exercer a sua profissão junto ao povo local e viver uma vida de testemunho cristãos através do caráter, das atitudes banhado de um estilo de vida simples na santa expectativa de glorificar a Deus “Sola Deo Gloria” em terras longínquas.

O autor nos diz que as agencias missionárias e as escolas de missões aqui no Brasil ainda estão focalizando sua força somente na preparação de missionários tradicionais. Porém diz ele que a pouco treinamento para os profissionais brasileiros que são voluntários para o emergente ministério dos fazedores de tendas.

O autor salienta que o mundo hoje vem a cada dia apresentando vários desafios a igreja de Cristo e sua missão no mundo, logo ele entende que o ministério dos fazedores de Tenda é uma ferramenta na causa missionária e da missão da igreja.

O ministério dos fazedores de tenda tem uma história brilhante não de agora mais de tempos antigos e se mistura no palco da história das missões mundiais, pois é relatado nos anais da história que há fazedores de tendas entre os primeiros missionários.

O autor nos faz ver que entre os “ Nestorianos” do século V e IX já havia esse ímpeto missionário como também a conhecida comunidade dos “Morávios” do século de ouro da missão o século XVIII evangelizavam através da profissão. O autor salienta que a lista dos fazedores de tendas ao longo da história de missões é longa e também bela e educativa como a Missão da Basiléia do século XIX, os Navegadores etc.

A gênesis dos fazedores de tenda se deu na realidade dos povos menos alcançados produzindo assim um interesse muito grande de alcançá-lo e isso gerou e mobilizou a formação de associações dos fazedores de tendas e consequentemente de uma rede internacional que promovesse e facilitasse esse ministério brilhante.

O autor cita Christy Wilson Jr. que foi pioneiro nesta área e também teve um papel importante como representante de um grupo de trabalho formado no Congresso de Lausanne II que teve como objetivo fazer estudos e desenvolver esse ministério.

A partir daí varias organizações se formaram dando apoio a esse ministério como “ Global Careers”, “Canadian Tentmaker Network”, “ United States Association of Tentmakers” “BiG Partners Network” Tentmaker International Exchange “ TIE”, etc. Tudo isso foi regado de estudos, conferencias, conscientização, urgência, acordos etc.

Essa nova realidade diz o autor citando “Danny Martin” serviu de compreensão de que Deus estava fazendo algo novo no campo da missão abrindo assim a obra missionária para todos que fazem parte do corpo de Cristo com isso ele atesta dizendo que “ missão não é mais tarefa exclusiva do obreiro cristão de tempo integral mais é tarefa e responsabilidade de todo o cristão”.

No que tange o Brasil o autor relata que o país tem uma participação muito forte hoje em missões mundiais e um grande potencial. O Brasil pode sem dúvida contribuir muito em missões mundiais através do apoio dos cristãos profissionais a serem fazedores de tendas transculturais.

Nos últimos 15 anos vários esforços neste sentido tem sido feito aqui no Brasil através da “ Comibam”, “Proemi”, “Cem” “AFTB” (Associação de Fazedores de Tendas do Brasil) etc. com o alvo de educar acerca da importância do ministério dos Fazedores de Tendas mostrando para o profissional cristão que ele pode muito contribuir na área da missão sem deixar a sua profissão.

O autor em seu livro faz uma longa exposição para definir o que é de fato um fazedor de tendas. Entre tantas definições expostas a da “TIE”, que também é adotada pela “AFTB”, sublinha dizendo: “ Que os fazedores de tendas são testemunhas cristãs, de qualquer nação, que, por meio de suas habilidades e experiência profissionais, conseguem entrar e se manter numa outra cultura, com a intenção principal de fazer discípulos de Jesus Cristo, e, onde for possível, estabelecer e fortalecer igreja.

O autor também tenta desmistificar e trazer a luz a importância de entender neste sentido o chamado cristão para missões. Ele deixa claro que esse chamado não são para um grupo minoritário de profissionais da fé mais para todo o povo de Deus. Citando o missiólogo David Bosch ele mostra que é um erro fazer um divisionismo entre clero e laicato.

Bosch mesmo diz que esse paradigma tem dominado a Igreja Católica mais também o mundo protestante. Esse modelo deve ser substituído pelo conceito baseado na reforma que é o sacerdote de todos os santos. O ministério salienta o missiólogo Bosch não pode ser um monopólio de homens ordenados mais uma responsabilidade de todo o povo de Deus de alcançar os não alcançados com o evangelho do Rei.

Pensando assim o autor diz que o chamado de Deus tem várias facetas no que tange ao fazedor de tendas esse chamado não é largar seu emprego mais servir a Deus no seu campo de trabalho.

O mundo em que vivemos deve ser levado em consideração o mundo religioso que cresce para longe de Deus, o contexto político que é sufocante, e o contexto econômico. O ministério de fazedores de tendas oferece uma forma segundo o autor de abençoar essas regiões aonde vivem os menos favorecidos, os pobres, os marginalizados, os desempregados, os perdidos e com a sua profissão é fé levar Cristo a esses povos.

Hoje a realidade de muitas igrejas no que tange a missão e seu sustento do missionário integral no exterior é alta já o fazedor de tendas se auto sustenta no campo missionário e isso facilita a obra missionária transcultural.

O autor pensando em tudo isso diz que os conceitos do ministério leigo e da missão da igreja aqui no Brasil está sendo recuperada em virtude de uma ênfase evangélica universal na teologia do sacerdote de todos os santos.

Derek Christensen diz que “ O ministério dos fazedores de tendas não é apenas uma estratégia, também é uma teologia e essa teologia fala que o corpo todo, a igreja, existe, para a missão e o mundo dos profissionais é um local válido para se realizar a missão”.

O ministério dos fazedores de tenda recebe do autor uma fundamentação bíblico-teológica, pois ele trabalha com vários personagens bíblicos que no desempenho da sua profissão serviram ao Senhor Deus em outras nações e culturas sendo fiéis a Deus em seu testemunho e serviço.

Ele apresenta de maneira clássica a vida do profeta “Daniel” a vida do líder “José” e a vida do copeiro “Neemias” que no Antigo Testamento viveram essa realidade transcultural de fidelidade a Deus no mundo do seu trabalho e do seu ofício.

Esses exemplos citados aqui pelo autor servem de treinamento e reflexão para todos aqueles que querem desempenhar esse ministério em terras estrangeiras, pois “José do Egito Daniel e Neemias” deixam para as futuras gerações um legado de fé e testemunho de simpatia e trabalho.

Um personagem que recebe uma atenção especial é justamente o apóstolo Paulo. O próprio termo “ fazedor de tendas” tem a sua origem na sua profissão na qual ele exercia em muitas ocasiões para se auto sustentar enquanto fazia a vontade de Deus.

Em Corinto o apóstolo dos gentios junto com “Áquila e Priscila” exerceu a sua profissão de fazedor de tendas ( At.18.1-4; At.20.32), mais tarde ele se dedicou plenamente e integralmente ao ministério (At.18.5-6), Paulo usava esse recurso para não ser pesado para as igrejas já que a maioria delas era de pessoas simples, pobres e escravos com pouco recursos financeiros. (I Cor. 9.3-18).

Paulo também deixa segundo o autor um legado para os fazedores de tenda quando percebe-se que ele não usou a sua profissão para melhorar seu padrão de vida mais para proclamar o Reino de Deus pois a sua profissão nunca foi o foco principal da sua vida afirma Philip John Greenwood.

O apóstolo Paulo era sim motivado por missões e obediência ao chamado e não pelo materialismo e o egoísmo tão em voga hoje. “Áquila e Priscila” também recebem uma atenção especial no que tange a esse ministério, pois eles dedicaram também suas vidas a causa maior do Reino de Deus sendo fiéis amigos do apóstolo Paulo ( Rm. 16.3,4; II Tm.4.9-19).

O autor sublinha que a história da Bíblia é a história de um Deus missionário, que no decorrer da história dos homens se dedica á sua missão de salvação. Ele ressalta que vimos aqui neste relato que Deus não age sozinho ele age em equipe.

O autor diz então que a teologia do ministério dos fazedores de tendas é uma teologia da soberania absoluta de Deus e tem as disciplinas de “Missão” e “Diaconia” da Teologia Prática.

Essas pessoas comuns “ José, Daniel, Neemias, Paulo, Áquila, Priscila” ofereceram as suas profissões como também as suas habilidades para Deus e se tornaram parceiros da ação salvífica de Deus na história da salvação. Vimos neste relato a criatividade de Deus na grande variedade de circunstâncias e maneiras em que profissionais foram integrados no seu plano para o avanço do seu reino e revelação da sua glória salienta o autor.

Philip John Greenwood também mostra para nós um caminho de reflexão quando ele trás para a arena da conversa a figura do educador Paulo Freire na qual ele dá um zoom pedagógico no aspecto de sua teoria da educação libertadora. Freire está certo quando sintetiza dizendo: “ Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo”, com isso ele faz uma crítica a educação bancária e mostra que educação é um processo de libertação e de transformação como também é um processo que não se encerrou e não vai se encerrar.

O autor também mostra a grande contribuição do teólogo René Padilha no aspecto do foco missiológico para a capacitação de profissionais cristãos numa visão integral. Padilha foi uma das vozes mais marcante do Congresso Internacional sobre Evangelização Mundial conhecido como “ O Pacto de Lausanne I”, realizado em 1974.

Padilha é considerado um dos “pais” da busca por uma missão da igreja que ao mesmo tempo seja bíblica e contextual diz o missiólogo catarinense Valdir Steurnagel. O conceito da missão integral considera o ser humano em todas as dimensões da sua existência. Para Padilha “ a salvação em Cristo envolve tanto o perdão de pecados (Jo. 1.9) como a vitória sobre o mundo (I Jo. 5.4) por meio da fé”.

Essa verdade diz o autor Greenwood em Padilha deve ser revista pela a igreja no sentido que a transformação não está somente pautada na salvação de almas mais ela inclui tanto a transformação do indivíduo como também a transformação do mundo pelo poder do Santo Espírito e isso tem enorme abrangência de cunho social, político, econômico, ecológico desembocando num rompimento com status quo que escraviza e sufoca o indivíduo e a sociedade.

Padilha ainda salienta em tom de alerta que a igreja chamada para realizar a missão integral deve tomar vigilância contra os perigos que tenazmente os cerca como ‘ o consumismo e o materialismo o culto a esses deuses falsos conduz segundo ele a um “estilo de vida egoísta que desvia a igreja da sua missão”.

Esses dois pontos aqui abordados “Freire” e “Padilha” destacam a valorização do ser humano a transformação por meio de um processo educativo contínuo, a valorização do outro como digno de presenciar a encarnação do Evangelho na vida de testemunhas cristãs.

O autor nos mostra também em cima dessa análise “ Freire e Padilha” no campo teórico, vários testemunhos de fazedores de tendas no campo prático da missão transcultural. Ele analisa suas crises, dificuldades, depoimento etc. que serve de alerta para os missionários de “Tendas”.


Pensando assim é feito uma análise sobre a preparação dos missionários fazedores de Tendas em nosso país e a constatação do autor é que a preparação dos fazedores de tendas transculturais no Brasil ainda é muito limitado e tímida. Por outro lado os profissionais aqui no Brasil em virtude da cultura e do seu estilo conseguem assumir em culturas diferente um estilo de vida simples e se adaptar de forma notória.

Ainda se tratando da formação dos fazedores de tendas muitos acreditam que a formação tem mais haver com caráter do que com acúmulo de informação “ Christensen”, Jonathan Lewis propõe três dimensões principais: Primeira a dimensão “cognitiva”. A segunda de “habilidades” e a terceira de “afetividade”. Ele também diz que isso acontece em três métodos principais: A capacitação “ formal, a não informal e a informa” ou seja na “sala de aula”, “na experiência prática” e “nos relacionamentos em comunidade”.

Também é citado pelo o autor no aspecto da formação que o fazedor de tendas tem que ter uma vida de oração de devocional entender a realidade da batalha espiritual, ter uma visão de missão a partir da igreja local, ter uma relação saudável com agências de missões, fazer curso bíblico de aprofundamento ter uma mentoria, viagens missionárias de férias, intercâmbio, retiros espirituais etc.

A maioria das empresas seculares valoriza os seus profissionais possibilitando cursos de reciclagem, curso de capacitação, de habilidades, de gestão etc. Da mesma forma diz o autor poderia se criar cursos assim para profissionais com conteúdo teológico. Finalizando o seu trabalho Philip John Greenwood diz que a igreja evangélica no Brasil deve obedecer o chamado de Jesus Cristo de fazer discípulos em todas as nações e deve também reavaliar seus conceitos no que tange o chamado como parceiros de Deus, pois várias realidades tem se mostrada.

O autor também diz que o mundo dos menos alcançados está esperando os profissionais cristãos fazedores de tenda, pois eles têm muito a contribuir no aspecto da missão, no aspecto econômico, social e espiritual. Deus sem dúvida está chamando uma geração de profissionais brasileiros cristãos que possam com toda alegria e fé testemunhar de Cristo para essas nações que precisam ouvir do Evangelho que transforma.

Eis aí um grande desafio para a igreja evangélica brasileira levar o evangelho integral para o mundo através dessa nova porta que Deus está abrindo nesse novo soprar do Espírito capacitando profissionais para a sublime tarefa de ser parceiros de Deus na evangelização dos povos cumprindo assim as palavras de Isaías 49.6b “ Também farei de você uma luz para os gentios, para que você leve a minha salvação até os confins da terra”

A abordagem feita pelo autor é de sua importância para a igreja brasileira, mesmo sendo uma temática tão antiga a igreja ainda não prestou a devida atenção para esse ministério importante para a proclamação do evangelho integral em terras estranhas.

Quando prestamos a atenção ao conceito bíblico do assunto percebemos que devemos de fato criarmos mais espaços para esse desenvolvimento dentro das igrejas brasileiras que está prestado mais atenção em coisas triviais do que na missão integral.O ministério de tenda ventilado aqui com muita energia e visão bíblica deve ser levado em consideração nas igrejas, em escolas de missões, em seminários e faculdades teológicas.

A igreja de fato vem ao longo dos anos perpetuando uma visão dicotomizada do ministério que é fruto da mentalidade católica do “Clero- Laicato”, ainda na prática estamos engatinhando no conceito reformado do sacerdócio de todos os santos e da responsabilidade de todos para a tarefa missionária.

Muitas pessoas ainda pensam que vocação está somente restrito ao ministério de tempo integral enquanto elas podem ser uma benção por meio do seu profissionalismo. Acredito que Deus chama pessoas para o ministério de tempo integral mais fazer isso uma dicotomização não é bíblico e nem histórico. Creio que advogando essa temática o autor não quis de forma alguma fazer uma crítica ao missionário de tempo integral mais apresentou uma nova formatação de fazer missões através da profissão.

Essa nova coloração em missões é de sua importância aonde o evangelho enfrenta forte oposição e também aonde a situação do povo é precária. O ministério dos fazedores de tenda sem dúvida é uma janela no mundo da missão integral que deve ser apoiado pela igreja visionária.

O autor poderia em sua temática incentivar também aqueles que são profissionais mais que não tem a chamada para a missão transcultural. Acredito que o autor poderia ter ventilado o fato do ministério do fazedor de Tendas não ser somente em terras estrangeiras mais em terras, nacionais, estaduais e municipais, pois o profissional deve ter ciência que ele pode ser uma benção e um canal de Deus para abençoar pessoas através da vocação da sua profissão.

Pastor Carlos Augusto Lopes
Teólogo
Seminário Teológico do Sul - S.T.S.

DE CIDADE EM CIDADE: ELEMENTOS PARA UMA TEOLOGIA BÍBLICA DA MISSÃO URBANA EM LUCAS-ATOS.


BARRO, Henrique Jorge. De Cidade em Cidade: Elementos para uma Teologia bíblica de missão urbana em Lucas – Atos.

Jorge Henrique Barro, doutor em teologia pelo Fuller Theological Seminary (EUA), mestre em missiologia pela mesma instituição é diretor e professor da Faculdade Teológica Sul Americana e diretor executivo da Fraternidade Teológica Latino Americana é pastor presbiteriano e autor de vários livros que tem contribuído para a comunidade evangélica no Brasil.

Em seu livro “ De cidade em Cidade” que é fruto colhido da sua tese de doutorado, o autor nos leva a ter uma visão bíblica da teologia da cidade oriunda do livro de Lucas e Atos dos Apóstolos. O Dr. Jorge Henrique Barro divide o seu livro em sete partes para a nossa compreensão de sua linha mestra que é justamente “ O método da teologia de missão de Lucas” a “ Missio Dei: Deus continua a trazer salvação para o seu povo” e também a “ Missio Christi: Deus traz a salvação através de Jesus Cristo. ”

Ele continua mostrando a “ Missio Spiritu Sancti: o Espírito Santo comissiona o povo de Deus a proclamar a salvação” e aborda finalizando “ Os pobres em Lucas e Atos”, “ Personagens-Tipo em Lucas - Atos” e conclui com “ Recomendações”, dando uma visão macro para o desenvolvimento de uma missiologia integral trinitariana.

O autor nos mostra que Lucas de uma forma organizacional nos mostra o desenvolvimento do ministério de Jesus Cristo como também a narrativa da igreja incipiente em Atos dos Apóstolos.

Através disso o autor reflete um caminho de uma teologia bíblica da missão urbana da igreja na perspectiva Lucas- Atos. Barro deixa claro que Lucas não é simplesmente um historiador ou um teólogo estático mais é justamente no caminho que ele mostra a atividade de Jesus e sua comunidade como também os contornos geográficos, culturais etc.

Lucas mostra que a práxis de Jesus será a práxis da sua comunidade e sua preocupação narrativa é focar a salvação de Deus e sua atividade passado-presente. Ele também nos mostra que a práxis da igreja é uma conseqüência da sua experiência com o Senhor que ressuscitou e uma resposta ao seu santo chamado missionário.

Neste sentido Barro nos diz que a “ práxis”, se torna uma chave para compreender Lucas e sua teologia de missão e compreender também a teologia latino americana. O autor mostra que a centralidade da teologia lucana passa pela missão tripartiti da “Missio Dei, Missio Christi e Missio Spiritu Sancti”.

Para o autor Missão significa “ anúncio’ e isso tem implicações de continuidade e descontinuidade mostrando que Deus continua a trazer salvação para o seu povo por intermédio da “missio ecclesiarum” da missão da igreja no mundo. Essa missão eclesiológica “ universal” passa pela compreensão da missão trinitariana que é clara na teologia de “Lucas - Atos’, “ Deus Pai, Deus Filho e Deus Espírito Santo.”

Para Barro em sua pesquisa a missão de Jesus é missão de cidade em cidade (Lc.4.43) “ Nazaré a Jerusalém” (Lucas) e de “ Jerusalém a Roma” (Atos) pensando assim no aspecto lucano a cidade tem um foco especial, pois as boas novas foram espalhadas migrando do chão judeu para o mundo e isso é continuidade que vem através da igreja no anúncio holístico das boas novas.

Para o autor Lucas - Atos devem desempenhar um papel de centro e não excêntrico no desenvolvimento de uma teologia bíblica da missão urbana e o modelo cristológico se evidencia da periferia (Galiléia) para o centro (Jerusalém) no avanço missional e essa missão é contemplada com a unção do Espírito Santo que é fartamente mencionado por Lucas (Trinta e três vezes no seu evangelho) e (quarenta e duas vezes em Atos dos Apóstolos)

Barro nos diz com eloqüência que o programa de Jesus era um autêntico programa de salvação, no poder do Espírito Santo, trazendo libertação, perdão, cura e restauração para os excluídos da sociedade. Pensando assim o autor enfatiza que a agenda de Jesus na cidade era “ pregar a boas novas aos pobres, proclamar libertação aos cativos, restaurar a vista aos cegos, libertar os oprimidos e proclamar o ano aceitável do Senhor”.

Olhando para a missão de Jesus na perspectiva da Galiléia o autor nos diz que três pontos devem ser analisados para uma compreensão sintetizada: primeiro “ A centralidade do reino de Deus”. Segundo ponto “ A Missão a partir da periferia” e terceiro ponto “ A missão a partir da autoridade de Jesus”. Barro mostra ainda várias análise na missão a partir de outras realidades messiânicas da cidade como por exemplo a cidade de Jerusalém e todas as suas implicações que nada mais é do que implicações missiológicas da cidade

Essa missão de Cidade em Cidade só pode ser possível segundo o autor pela Missio Spiritu Sancti, pois o poder do Espírito Santo torna o arrependimento e perdão possível para as nações. O autor também salienta de maneira sábia que Lucas mostra dois ingredientes que são chaves na compreensão da missão. São eles as fórmulas Cristológica “ em meu nome”, e o alcance cristológico “ a todas as nações”.

Pensando ainda no Spiritu Sancti o autor nos diz que o Santo Espírito é o agente mais importante da missão de acordo com a visão de Lucas, pois no dia de pentecostes, Cristo, através do poder do Espírito Santo, abre as portas e envia os discípulos para o mundo ( Bosch). Jorge Barro sem dúvida nos coloca na esteira de uma teologia bíblica da missão urbana da igreja trazendo uma vasta contribuição para a missão da igreja hodierna e para os eclesianos. Ele também enfoca que a missão deve ser a partir do Espírito Santo como também de uma pregação ortodoxa e sadia.

Ele mostra também que essa missão eclesiológica é feita de ação e por isso o Espírito Santo capacita a igreja a realizar sinais e maravilhas com um propósito claro para a salvação, pois a missão é para os outros e essa missão é para a cidade pois ela é central na teologia lucana. Outro aspecto de suma importância abordado por Jorge Barro é justamente o lugar do pobre na teologia de Lucas – Atos, pois Lucas dá bastante ênfase a eles e isso denota que eles eram presentes dentro e fora da comunidade a qual Lucas escreveu.

Esse olhar do autor deve ser percebido no contexto da missão urbana, pois como Lucas somos hoje rodeado de “pobres” em seu aspecto integral logo a igreja deve ter uma missão que é a missão lucana na perspectiva de ver como Jesus Cristo e a igreja primitiva virão o pobre, o excluído, o falido etc. A missão da igreja deve passar pela ótica integral lucana no modelo maior que é Cristo.

Uma das coisas importantes citado por Jorge Barro e que deve ter uma releitura entre os eclesianos hoje é justamente a importância que Lucas dava para os pobres em sua teologia. Lucas menciona e mostra quem são eles naquilo que Barro chamou de personagens tipo em Lucas - Atos. O autor citando John Roth nos dá uma visão dessa preocupação pobrística de Lucas. Ele define nove que são: os cativos, os machucados, os cegos, os surdos-mudos, os leprosos, os aleijados, os mortos, e os pobres.

Em suas “ Recomendações”, Jorge Barro diz que o movimento missionário do Novo Testamento foi um movimento urbano, pois ele se espalhou de cidade em cidade depois do pentecostes. Robert C. Linthicum citado pelo autor diz que “ a igreja é chamada a desenvolver sua missão no contexto urbano, á medida que o mundo se torna cada vez mais urbano”. Barro reitera dizendo que não podemos enfrentar os desafios que o contexto do mundo nos apresenta sem compreender as perspectivas missionárias que existem na Bíblia em foco “ Lucas e Atos” e perceber a missio Dei em Cristo e na igreja dos primeiros irmãos e aplicar “ práxis” na vida da cidade em todos os seus contornos integrais.

Para isso o autor citando seu tutor Charles Van Engen nos diz que não existe missão sem Bíblia, logo missão, Bíblia e contexto estão juntos e não podem ser dicotomizado pela igreja de hoje, pois a Bíblia é o nosso conteúdo, o contexto é a nossa arena e a missão é o que fazemos em nosso contexto ancorados e estimulados pela Bíblia reforça o Dr. Jorge Barro.

Não podemos esquecer diz o autor que a missão de Lucas é trinitariana e essa deve ser a nossa missão. “ Missio Dei, Missio Christu e Missio Spiritu Sancti”, só assim iremos integralizar os centros urbanos e glorificar o nome de Deus “ Soli Deo Glória”, fazendo a missão e abençoando as pessoas, ajudando os pobres e trazendo a consolação e a transformação que o evangelho faz.

Se a igreja não encarnar a missão lucana ela se torna irrelevante para o mundo e sua mensagem fica fragmentada e sem tempero. A igreja latina não pode esquecer os pobres e nem perder seu foco central de integralidade a partir da missão trinitariana.

Jorge Barro conclama a igreja brasileira a não perder essa visão do pobre e da missão, mais ao contrário disso incluir eles na sua agenda e comunhão, pois toda forma de modismo denominacional aleija a missão da igreja que é a missão trinitária na cidade. Ele mesmo encerra em forma de alerta e de oração dizendo: “ Que a igreja possa ser um agente apostólico da missão de Deus nas cidades do mundo, especialmente a do Brasil”.

Sem dúvida a contribuição que Jorge Barro dá para a igreja brasileira deve ser louvável, pois traz para o centro a importância de pensar a missão em forma integral e não denominacional. A igreja deve pensar a sua missão não a partir de um modismo e nem a partir de uma teologia gelada academicista que não dá um passo fora do gabinete ou sala de aula.

A igreja deve viver o evangelho integral na aglutinação da sua missão trinitariana. Pensar a cidade em termos teológicos e não só no âmbito sociológico é pensar a missão de Deus para essa mesma cidade na qual Barro aqui coloca.

O pélago da teologia da missão integral desenvolvida aqui por ele deve ser ventilada na igreja brasileira como missão a ser desenvolvida a partir de uma práxis bíblica. A grande diferença de ler a obra de Barro das obras da teologia da libertação é que ele não negocia a Bíblia em tom de melhoramento puramente social, Barro entende que a missão da igreja para cidade deve se a partir da Bíblia como chão seguro para toda missão.

Acredito que os eruditos da missão integral devem a partir da realidade brasileira escrever sobre missão trinitariana na cidade não em tom acadêmico mais em tom entendível. Acredito que os teólogos da missão integral têm compreendido que suas linguagens devem ser mudadas no sentido que devemos colocar dentro das nossas fileiras não só a intelectualidade teológica dos pastores formados diplomados mais os pastores que labutam nos cantões do Brasil que não tem formação e que precisam como os pobres serem ajudados.

Jorge Barro falou sobre a missão de Jesus de cidade em cidade em busca do fraco, do necessitado etc. Assim deve ser a igreja mais também os arquitetos da teologia integral e urbana. Devemos buscar os líderes e ajudar eles no nobre caminho trinitariano de levar as boas novas de cidade em cidade incluindo os pobres no campo teológico, os cegos no campo do ensino, os fracos que não tiveram força e chance para estudar numa escola formal, todavia são artesões da vida e da obra de Deus.

Pastor Carlos Augusto Lopes
Teólogo

Seminário Teológico do Sul - S.T.S.



CIDADE DE DEUS CIDADE DE SATANÁS: UMA TEOLOGIA BÍBLICA DA IGREJA NOS CENTROS URBANOS.



INFORME DE LEITURA
CARLOS AUGUSTO LOPES

LINTHICUM. C. Robert. Cidade de Deus Cidade de Satanás: Uma Teologia Bíblica da Igreja nos Centros Urbanos. Belo Horizonte. Visão Mundial 2002
Dr. Robert C. Linthicum é diretor de Ministério Urbano da Visão Mundial Internacional é presidente do Conselho de Coordenação Urbana da Igreja Presbiteriana (EUA) e também escritor.

Ele possui também o título de Doutor conferido pelo Seminário Teológico de São Francisco e mestrado pelo Seminário de McCormick e pela Escola Graduada de Teologia Wheaton. Ele também exerceu pastorado urbano em várias cidades dos Estados Unidos.

Em seu livro Cidade de Deus, Cidade de Satanás, o autor nos mostra uma forte teologia bíblica da cidade. Ele diz que na Bíblia, a cidade é um retrato tanto da habitação de Deus e do seu povo como do poder de Satanás e seus escravos.

Ele reafirma em suas pesquisas que a cidade é o palco principal na qual se desenvolve o drama da salvação como também é o palco dos descasos sociais e de uma nova realidade que surge no sentido de urbanização e injustiça social.

Pensando assim o autor nos convida a repensar os conceitos bíblicos da cidade reformulando um teologia bíblica da igreja nos centros urbanos. Robert Linthicum divide o seu livro de 387 páginas em três capítulos: “ A cidade como Campo de Batalha”, o segundo capítulo a “ Igreja: Ministério Urbano de Deus”, e o terceiro “Disciplina Espiritual: Poder para o ministério”.

O autor nos diz que as cidades no mundo inteiro estão enfrentando uma explosão demográfica sem precedentes. Pela primeira vez, na história documentada do nosso planeta sua população será mais urbana do que rural.

Baseando sua argumentação em fontes de pesquisas o autor prossegue dizendo que em 1950 havia apenas sete cidades no mundo que tinha uma população com mais de 5.000.000. Vinte e cinco anos mais tarde este número saltou para trinta e quatro e nos próximos vinte e cinco anos, haverá noventa e três cidades em nosso planeta com a população maior que 5.000.000. Por volta de 2020 projeta-se que o terceiro mundo abrigará oitenta a noventa e três destas mega- cidades.

Eis aí um grande desafio para as igrejas latinas e de todo mundo, pois a configuração populacional tem contornos de desafios e oportunidades para a comunidade da fé. Linthicum nos diz que Deus está chamando a igreja para dentro da cidade e os cristãos devem reconhecer e aceitar entusiasticamente esse novo desafio emergente.

O autor prossegue dizendo que realmente nenhuma geração na história do cristianismo teve que enfrentar os desafios pós-modernos e os problemas humanos de tal magnitude ou de controlar um poder urbano de tal amplitude. Isso significa diz o autor que a igreja de Cristo está diante de uma grande oportunidade para ministrar a evangelização. O mundo está mudando para a cidade e nós como igreja devemos estar lá para dar-lhes as boas vindas em nome de Jesus Cristo.

Para formular uma teologia bíblica para os centros urbanos Robert nos mostra que a Bíblia é um livro urbano. Ele diz que os mundos de Moisés, de Davi, de Daniel, de Jesus e de Paulo eram mundos urbanos. O autor argumenta e nos faz mergulhar na urbanidade de Ur dos Caldeus, a cidade de Abraão, a cidade de Nínive, a cidade de Éfeso e a cidade fantástica de Roma capital do orgulhoso Império Romano e tantas outras cidades. Como “ Alexandria, Corinto, Babilônia, Persépolis, Atenas, Jerusalém etc.”. logo percebemos que a Bíblia é um livro urbano todavia não enxergamos isso por que vimos ela como um livro rural.

Trabalhando o realismo da teologia Urbana o autor diz que a cidade é o local de uma grande e contínua batalha entre o Deus de Israel e/ ou a igreja contra o deus deste mundo. O autor trabalha essa verdade em sua argumentação mostrando essa temática de “Jave e Baal” Ele mostra também dentro do seu estudo que a cidade é criação de Deus e diz que dos 150 salmos do Livro de Salmos, 49 são da cidade e o mundo inteiro pertencem ao Senhor e isto inclui a cidade pois Deus deu para o ser-humano a capacidade de formar cidade.

O autor mostra a cidade como habitação do mal pessoal e sistêmico e diz que os sistemas clássicos de uma cidade é justamente o campo político, religioso e econômico como compreensão uma vez que esses expedientes estão fora da justiça e do projeto divino é instaurado o mal. e a Bíblia tem exemplos em abundância sobre este fato nas cidades que são os casos dos reis de Israel.

O autor também mostra que nossa cidade é habitação dos principados e potestades satânicas. Ele não trata esse assunto num sentido reducionista tão ventilado na batalha espiritual e teologia de modismo, mais trabalha essa temática a nível mais profundos e práticos que desembocam no dia a dia das cidades, dos governantes e dominadores deste mundo sem esquecer também o realismo da batalha espiritual bíblica.

Pensando assim ele mostra de maneira abundante quais são os propósitos de Deus para a cidade e mostra o amor de Deus por ela e a responsabilidade que Deus nos deu para com a cidade no estabelecimento da paz e do propósito maior a salvação e o envolvimento integral. A igreja como encarnação do Reino e expressão dele é a presença de Deus na cidade e seu representante. A igreja deve ser o protótipo de justiça para a cidade no aspecto de tratar os pobres e isso desemboca no âmbito econômico, político, social e espiritual.

A igreja não pode perder esse foco de desenvolver o seu ministério integral urbano, pois Cristo é o exemplo maior da missão bíblica da cidade, pois segundo o autor o amor de Deus pela cidade é excessivamente paciente e Cristo anela ver a cidade transformar-se em cidade de Deus. É verdade que a cidade recusa ser cidade de Deus e conseqüências são inevitáveis sobre a cidade que rejeita Cristo em todos os aspecto.

O autor diz que Jesus Cristo veio á cidade para morrer por seus sistemas e por seu povo e Cristo convida a igreja a pensar assim e participar do que ele fez. O autor também diz que a igreja de Cristo deve entender a sua vocação urbana e proclamar o Cristo Bíblico para o mundo. Por isso a igreja deve compreender qual é o seu papel na cidade esse entendimento cristológico e da missão moldará tudo o que as igrejas serão, farão e dirão na cidade.

O autor sugere que a igreja deve orar pela paz da cidade, pela saúde econômica da cidade, pela política da cidade, pela segurança da cidade, pelo povo da cidade etc. pois isso demonstra a preocupação integral da igreja pela cidade. Ele salienta que a cidade deve ser um lugar de saúde e a igreja tem papel fundamental nesse processo de cura e isso tem contornos sociais e não somente espiritual no chamado quadrante eclesial.

O autor cita D.L. Moody que diz que um pregador urbano verdadeiramente grande é o pastor que sobe ao púlpito cada domingo com a Bíblia em uma mão e o jornal na outra. Essa frase significa que é necessário tanto a percepção bíblica quanto a realidade urbana para que a proclamação na cidade seja eficaz.

Ele também nos mostra várias passagens bíblicas para formular uma teologia da cidade na pessoa de Jesus Cristo modelo maior da missão da Igreja Primitiva e do apóstolo Paulo. O autor faz uma pergunta: Quais os cristãos que devem ministrar na cidade? Ele responde dizendo que todos têm a incumbência de abençoar a cidade com o evangelho de Cristo por que a proclamação é absolutamente essencial para o trabalho da igreja na cidade e todos os cristãos urbanos são chamados para ser evangelistas.

O autor depois de ter trabalhado a vida de Neemias no aspecto da reconstrução da cidade de Jerusalém e todas as suas implicações diz que a igreja tem que levar a sério a avaliação bíblica da cidade como campo de batalha, pois a metade da população do mundo estará vivendo nas cidades. O autor também mostra que o caminho para o ministério urbano deve ser primeiro o caminho para dentro antes de ser para fora. Com isso ele nos lembra que devemos como igreja viver uma vida de espiritualidade sadia tais como “ auto biografia (Fp.3.5-11)” “ Silêncio” (Sal.46.10), “ relacionamento pessoal com as Escrituras”, “Oração” (I Ts.5.17), “ Orientação espiritual ou mentoria”, “período de devoção” etc.

A formação espiritual não é um fim em si mesmo mais é um meio importante, pois o caminho para fora é o caminho para dentro e o caminho para dentro é o caminho para fora. A igreja o Corpo de Cristo é chamada por Deus para anunciar um evangelho integral a toda a cidade. Depois de discorrer por muitos assuntos importantes no que tange a teologia Urbana o autor caminha por apocalipse 2 e 3 e mostra vários pontos importantes para a caminhada da igreja no contexto da cidade e encerra sua argumentação sobre a bandeira da teologia paulina que nos diz:

No demais, irmãos meus, fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder. Revesti-vos de toda a armadura de Deus, para que possais estar firmes contra as astutas ciladas do diabo. Por que não temos que lutar contra a carne e o sangue, mas sim contra principados, contra as potestades, contra os príncipes das trevas deste século, contra as hostes espirituais da maldade, nos lugares celestiais. Portanto tomai toda a armadura de Deus, para que possais resistir no dia mau, e , havendo feito tudo, ficar firmes” . ( Ef.6.10-13)

Por fim o Dr. Robert Linthicum nos diz que a chamada de Deus para você e para mim, como cristãos na cidade e como parte da igreja é sermos fiéis; fiéis a nos mesmos, fiéis aos irmãos, fiéis ao corpo de Cristo, fiéis aos pobres, aos aflitos, aos perdidos de nossa cidade, e assim, fiéis ao bom Deus. De fato a igreja evangélica deve entender que Deus tem nos chamado para um contexto urbano emergente. Conforme vimos no livro de Robert Linthicum a América Latina está experimentando um crescimento explosivo nas cidades e esse crescimento desemboca numa decadência social e pobreza.

A igreja deve conforme foi dito pelo autor apresentar o Evangelho Integral de Jesus Cristo na cidade e amar como Cristo amou os pobres, os necessitados, os cativos, os descamisados deste mundo e esse amor deve desembocar numa pregação cristocêntrica da missão que leva uma práxis bem articulado. O autor tocou no ponto do mal na cidade. Essa abordagem deve ser refletida na igreja hodierna. Não podemos simplesmente pensar que estamos inserido num contexto de batalha e perder o foco da batalha.

O mal deve sem duvidar ser freado com oração, pregação, exposição do evangelho etc. Mais ele não está somente intangível no sentido de batalha espiritual, ele tem cheiro, cor, formatação que devem ser denunciado pela igreja como a injustiça social, política, ecológica, econômica etc. A igreja que vive na cidade não pode viver uma fé intimista e uma espiritualidade voltada somente para o Céu mais ela deve desenvolver uma espiritualidade integral no tecido do seu chamado que é a missão em ação aqui na terra criação de Deus.

A igreja evangélica brasileira deve repensar o conceito de missão e deve estar aberta para essa nova realidade que chega com uma mentalidade pós-moderna e globalizante dificultando a missão mais trazendo também grande oportunidade para comunicar o evangelho integral de Cristo. O livro de Robert trabalha um tema de suma importância. O autor mostra que essa realidade urbana aonde brota a pregação do evangelho tem fundamentação bíblica como nós vimos, porém acredito que o autor poderia pensar também em sua teologia a importância de focar a missão não só no aspecto urbano mais em toda a sua extensão urbanista não só social mais ideológico.

O autor poderia também trabalhar em seu livro algo que é importante para a missão que é justamente o período pós-moderno que as cidades estão inseridas, uma nova mentalidade que invade o mundo globalizado. O autor poderia discorrer também como teologia urbana a importância da igreja conhecer e estudar o mundo tribalista. Assim como na época Neo - Testamentária que existia as tribos “ dos fariseus, dos publicanos, dos essênios, os gentios, os gregos, os escribas e tantas outras e cada um com seus códigos, linguagens, culturas, ideologias e cosmovisão a igreja deve compreender as múltiplas tribos que existem hoje em dia para comunicar o evangelho integral.

O autor não tocou no ponto emergente que Invade as nossas cidades como “ fragmentação ideológica, niilismo, pluralismo, relativismo, narcisismo, consumismo, preconceito, discriminação, hedonismo, violência doméstica, jogatina etc. Essa nova onda de encarar a vida deve ser refletida numa teologia bíblica da urbanização, pois as cidades caminham para essa ideologia excêntrica e a igreja que exerce seu ministério na cidade deve ter respostas bíblicas para essa nova inquietação hodierna.

Creio que este livro nos leva para uma reflexão e um debate sobre a postura da igreja diante dos questionamentos que estão inseridos no tecido da cidade. Pensando assim precisamos urgentemente de uma resposta bíblica e uma práxis evangélica, pois assim glorificaremos o nosso Deus como fez Cristo indo de Cidade em Cidade.

SEMINÁRIO TEOLÓGICO DO SUL - S.T.S.